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domingo, 13 de novembro de 2016

Descomplicando o Poder Judiciário Brasileiro


Autor: João Paulo Meningue Machado
            Graduando em Gestão de Políticas Públicas - EACH USP
 O poder judiciário compõe, juntamente com o poder executivo e legislativo, o tripé que sustenta o Estado brasileiro, entretanto, assim como os demais poderes, o judiciário possui algumas características que o distingue dos demais. Essa distinção, como demonstra Sadek (2010), está no âmago de formação desse pilar nacional, onde inúmeras são as mudanças sofridas por ele e poucas são as pessoas que entendem o seu funcionamento de maneira plena. Assim sendo, este artigo tem dois objetivos, o primeiro é traçar, de maneira resumida, histórico de todas as modificações sofridas pelo poder judiciário; o segundo é explicar resumidamente a estrutura do poder judiciário nacional.
A história do poder judiciário brasileiro
No período colonial o poder judiciário nacional não existia, as instituições que são o embrião dele, na verdade, possuíam uma função policialesca e não tinham o poder de fato para fazer julgamentos relevantes para a nação. O topo da hierarquia do sistema de justiça nacional deveria responder as ordenações dos tribunais da corte de Lisboa (SADEK, 2010). Contudo, a grande maioria dos casos que necessitavam de uma resolução jurisdicional não era apreciada por eles, visto que esses tribunais portugueses decidiam apenas sobre problemas que envolviam grandes valores monetários. No século XVII, foram instituídos dois tribunais de segunda instância no Brasil, o tribunal do Rio de Janeiro e o da Bahia, no entanto, as grandes questões continuavam sendo endereçadas aos tribunais de Lisboa. Assim como em todos os outros ambientes que compunham a vida da sociedade brasileira, a chegada da corte real no século XIX também alterou profundamente o sistema judiciário nacional, pois foi a partir desse evento que a estrutura desse poder começou a ser criada. Um das modificações mais importantes da chegada da família real ao Brasil foi a transformação do tribunal regional do Rio de Janeiro em corte de última instância nacional. Esse tribunal passou a ter jurisprudência sobre outros territórios controlados pela corte portuguesa. Outros tribunais de segunda instância foram criados, bem como um tribunal militar. Esta estrutura foi modificada com a Constituição de 1824, onde o imperador brasileiro, Dom Pedro I, instituiu o poder judiciário junto com outros três, o poder legislativo, executivo e moderador. A criação do Supremo Tribunal de Justiça, de novos tribunais de segunda instância e a nomeação de três tipos de juízes foi lograda com essa nova mudança (SADEK, 2010).
A Constituição de 1824 concedeu ao poder moderador uma força que suprimia todos os demais, visto que era direito do Imperador Dom Pedro I, pessoa que ocupava o cargo de moderador, trocar os cidadãos que ocupavam os cargos dos demais poderes. Dessa forma, não havia independência do Judiciário, fato que compromete imensamente as decisões tomadas pela magistratura nacional (SADEK, 2010). O período entre a Carta constitucional de 1824 e a proclamação da República, em 1891, se caracterizou por leis que reforçaram a estrutura do poder judiciário nacional, onde cada pessoa que nele atuava sabia sua função. Em 1891 algumas reformas foram implementadas com a nova carta constitucional. A mais importante delas foi alteração lograda no mais importante órgão do poder judiciário nacional, isto é, a transformação do Supremo Tribunal de Justiça em Supremo Tribunal Federal. Este novo tribunal incorporou as funções do antigo ampliou-as e passou a ser composto por 15 juízes. Além dessa mudança, foi criada a justiça federal e as justiças estaduais. Cada estado passou a ser regido por um tribunal que determinava como era a estrutura do sistema de justiça nacional (SADEK, 2010). Outro fato importante do período da República Velha foi o movimento para alcança a autonomia do poder judiciário, onde a vitalidade dos magistrados e a irredutibilidade de seus vencimentos foram estabelecidas.
Em meados da década de 20, o poder judiciário brasileiro se encontra em crise. Há uma grande pressão popular por reformas que solucionassem dois problemas latentes, que eram a celeridade dos julgamentos efetuados e a dualidade do pode. O problema da celeridade foi combatido pela criação de turmas de cinco juízes que trariam mais agilidade aos julgamentos. Os assuntos constitucionais deviam ser tratados por sete juízes (SADEK, 2010).. A questão da dualidade era alvo de grandes debates, mas foi assegurada pela constituição de 1934, embora a unidade dos processos tenha sido implementada (SADEK, 2010). Vele salientar outras ações da constituição de 1934, a criação de Justiça Militar, da Justiça Eleitoral e da Justiça do Trabalho foram marcos importantes dessa constituição. No âmbito estadual é importante ressalvar a criação da carreira da magistratura e a obrigatoriedade de concursos públicos para tornar-se um magistrado público. O Estado Novo, como era de se esperar de um sistema de governo ditatorial, trouxe um retrocesso para a independência do judiciário, pois submeteu o poder aos mandos do ocupante do cargo executivo, isto é, Getúlio Vargas, o mesmo aconteceu com o parlamento nacional. A Justiça Federal e Eleitoral foram extintas, enquanto a Justiça Estadual ganhou a competência de julgar todos os atos referentes á União (SADEK, 2010).
A redemocratização de 1946 trouxe consigo o avanço em direção à autonomia do Judiciário nacional. A constituição desse ano, que foi responsável pelo movimento de independência da magistratura, também restituiu a Justiça Eleitoral e constitucionalizou a Justiça do Trabalho. Contudo, essa independência não durou muito, pois a tomada de poder pelos militares em 1964 suprimiu a autonomia entre os três poderes. O executivo, no que se refere ao seus abusos sobre o judiciário, detinha o poder de nomear e destituir qualquer integrante do mais alta corte nacional, caracterizando explicitamente a interferência executiva. O fim da dualidade judiciária proveu de mais celeridade os serviços do judiciário. Além dessa medida, diversos atos constitucionais dos militares também ordenaram leis inconcebíveis que deveriam ser respeitadas pelo judiciário, entre elas a suspensão do habeas corpus foi impactante para os cidadãos que faziam oposição aos militares. Por fim, leis e mais leis foram promulgadas com vistas a estender os tentáculos do executivo até que em 1977 mais uma medida transformou o procurador geral da República no representante do judiciário, segundo pesquisadores (SADEK, 2010).
Com o advento da nova República e, consequentemente, uma nova Constituição em 1988, a independência do judiciário, assim como em todas as nações consideradas democráticas, tornou-se um dos pilares de funcionamento do Estado brasileiro. A carta constitucional deixa isso claro através de seu texto. Ficou a cargo do poder judiciário a elaboração do próprio orçamento, bem como as ações que dizem respeito ao funcionamento administrativo da jurisprudência(SADEK, 2010). O STF continuou como órgão máximo da do poder supracitado, contudo, suas ações ficaram mais restritas a embates nutridos de questionamentos constitucionais. Uma das grandes inovações da nova lei máxima nacional foi a implementação do Superior Tribunal de Justiça, que é visa diminuir os julgamentos a serem realizados pelo STF. O STJ visa julgar as causas especiais em última instância aos julgamentos já realizados polos tribunais federais (SADEK, 2010).
Estrutura do poder judiciário brasileiro
A partir deste ponto iremos explicar resumidamente a estrutura organizacional do poder judiciário brasileiro, o organograma abaixo ilustra tal estrutura. Esse organograma será a base da explicação do funcionamento organizacional do poder judiciário brasileiro. Antes de começar a explicação é importante salientar que existem outros atores institucionais importantes no judiciário nacional que não serão tratados aqui, mas também atuam dentro dessa arena constitucional do poder judiciário brasileiro.
No topo do organograma encontramos o Supremo Tribunal Federal (STF), como podemos ver, esse órgão é o elemento máximo do poder judiciário nacional. Conforme decreta a Constituição Federal (1988), o STF – composto por onze ministros escolhidos pelo Presidente da República e analisados pelo Senado Federal –, é responsável por resolver conflitos que envolvam principalmente textos constitucionais que passam por questionamentos. O STF também aprecia outros tipos de litígios, tais como julgar ocupantes de cargos públicos com fórum privilegiado (Presidente da República, Deputados Federais, Senadores, Ministros e Procuradores da República), extradição solicitada por outros países e conflitos entre Estados, União e o Distrito Federal (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).
Junto com STF encontra-se o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – composto por 15 membros –, cuja principal função é tratar das operações realizadas pelo Judiciário, isto é, e sobre o encargo do CNJ que se encontra o controle interno do poder em questão; é ele, por exemplo, que determina qual será o orçamento total do poder judiciário. É obrigação do CNJ também o controle das operações do judiciário como um todo, a fim de evitar desvios da magistratura nacional.
Figura 1: Organograma do poder judiciário Brasileiro
















Fonte: Conselho Nacional de Justiça (2010)
No segundo escalação do poder judiciário nacional é feita a distinção entre os dois tipos de justiça existentes, isto é, justiça comum e justiça especial. A justiça especial é dividida em três especialidades Justiça do trabalho, eleitoral e militar, ao passo que a justiça comum divide-se em duas frentes, são elas a federal, onde são tratadas principalmente questões que interesse da União; e a estadual, onde são apreciados os conflitos que não se encaixam nos tipos de justiça citados anteriormente (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2010).
A justiça trabalhista, com base na Constituição Federal (1988), é composta por Tribunal Superior do Trabalho (TST), Tribunais Regionais do Trabalho e juízes do trabalho, conforme demonstra o organograma acima. O TST é o órgão que determina o juízo final referente a embates trabalhistas. Antes de o litígio chegar a esse órgão ele passa por duas instâncias (fases de julgamentos), a primeira decisão é determinada pelo juiz do trabalho. As partes podem recorrer ao Tribunal Regional do Trabalho (órgão de segunda instância) se a decisão do juiz não for aceita. Se alguma das partes recorre da decisão tomada em segunda instância, o litígio passa para a apreciação do TST, órgão de terceira instância da justiça do trabalho.
A justiça militar é composta por dois níveis instanciais, o primeiro é formado por juízes ou tribunais militares definidos por lei e o segundo nível é exercido pelo Superior Tribunal Militar. Essa parte da justiça especial é competente para julgar litígios envolvendo as forças armadas brasileiras (exército, marinha e aeronáutica). Qualquer embate referente às forças armadas nacionais começa a ser julgada nos tribunais militares inferiores, após o julgamento em primeira instância, caso haja recurso de uma das partes envolvidas, o litígio é endereçado ao Superior Tribunal Militar, onde será dada uma decisão final sobre o embate, salvo casos em que esteja envolvido questionamentos constitucionais, onde cabe ao STF a decisão final.
Por fim, a justiça eleitoral engloba os litígios envolvendo as eleições nacionais, isto é, votos, campanhas eleitorais, nomeação de representantes eleitos e ações do gênero. Assim como a justiça do trabalho, a justiça eleitoral também possui três instâncias. A primeira é representada pelo juiz eleitoral, os recursos de segunda instância são endereçados ao Tribunal Regional Eleitoral. Se houver recurso da decisão do TRE, o litígio passa a ser apreciado pelo Superior Tribunal Eleitoral. Este possui poderes para, por exemplo, caçar a eleição de um Presidente da República caso haja irregularidades na sua campanha eleitoral que justifique o ato da cassação (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2010).
A estrutura da justiça comum possui similaridades com a estrutura da justiça especial, isto é, a justiça estadual e federal também são divididas em três instâncias, onde o Superior Tribunal de Justiça (STJ) representa a terceira instância decisória. A justiça federal analisa litígios referente a União, suas empresas e autarquias. Neste sentido, todas as ações que questionem posicionamentos da União e suas empresas. A primeira instância da justiça federal é composta pelos juízes federais, a segunda instância, por sua vez, é representada pelo Tribunal Regional Federal, existem cinco no Brasil. Por fim, como foi dito anteriormente, a decisão final é tomada pelo STJ. Todos os outros tipos de conflitos jurídicos são tratados pela justiça estadual (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2010). Assim sendo, qualquer conflito entre duas pessoas físicas comuns, desde que não se encontre ligados à área trabalhista ou militar, são tratados pelos juízes de direito (juízes estaduais), em primeira instância. A segunda instância é representada pelo tribunal de justiça. Por fim, assim como na justiça federal, o STJ dá a palavra final sobre os conflitos. A justiça militar estadual julga conflitos que referem-se à ações dos agentes militares estaduais, isto é, policiais militares e bombeiros. Ela também se divide em duas instâncias, antes de ser apreciada pelo STF. A primeira instância é composta pelos Juízes Auditores Militares Estaduais, enquanto a segunda instância é representada pelo Tribunal de Justiça Militar Estadual, por fim, os conflitos são resolvidos em terceira instância pelo STF (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).
Com escândalos como o julgamento do “Mensalão” e do impeachment o poder judiciário foi, durante várias vezes, capa de jornais nacionais, contudo, foi notável a falta de informação da população brasileira sobre o funcionamento desse pode, este artigo procurou descomplicar um pouco mais o judiciário brasileiro. Este era o objetivo deste trabalho, pois acreditamos que o poder judiciário, entre os três poderes que regem o Estado brasileiro, possui o maior distanciamento da sociedade. As causas deste distanciamento são diversas, por exemplo, as leis que regem as funções do judiciário são consideradas incompreendíveis por grande parte da população que não possuem qualquer contato com elas; o fato desse poder ser o único que não é eleito pelo povo também faz com que haja certa incompreensão; por fim, existem dois outros fatos que fazem com que não o judiciário seja tão apartado da sociedade brasileira, são eles, a inexistência de um estudo histórico do judiciário na formação básica nacional e também a estrutura complexa do poder, buscamos atuar justamente nesses dois pontos, a fim de desmistificar, em certo sentido, o poder judiciário do Brasil.
Bibliografia
BRASIL. Constituição. Senado Federal, Brasília, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 07 de novembro de 2016.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Quem é quem na Justiça brasileira. Brasília, 2010. Disponível em: http://cnj.jus.br/noticias/cnj/59220-primeira-instancia-segunda-instancia-quem-e-quem-na-justica-brasileira. Acesso em 07 de novembro de 2016.
SADEK, Maria Tereza. A organização do poder judiciário brasileiro. Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: http://books.scielo.org/id/4w63s/pdf/sadek-9788579820328-02.pdf. Acesso em 08 de novembro de 2016.

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