Pesquisar este blog

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Da política Robin Hood às avessas em rumo à justiça tributária

Autor: Paulo Cezar Guerra Alves
Graduando em Gestão de Políticas Públicas - EACH USP

A política "Robin Hood" dos avessos é notória no sistema tributário brasileiro, no qual se "rouba dos pobres para dar aos ricos", uma vez que a tributação se dá de forma incoerente entre as classes sociais, pois pessoas pobres são as mais prejudicadas com a conjectura do sistema tributário atual, uma vez que são os mais tributados em relação aos seus rendimentos relativos, bem como os são ofertados serviços e bens públicos sucateados, visto que o sistema tributário atual favorece a concentração de renda que por sua vez não é revertida em investimentos públicos.

Os impostos são, sobretudo, cobrados na incidência do consumo de produtos, em impostos como o IPI, o ICMS e o ISSQN(1), e não com base na propriedade. Isto faz com que haja uma distribuição desigual no recaimento da tributação dependendo da classe social das pessoas. Paulino, Araújo e Gassen (2013) apontam que os tributos incidentes sobre o patrimônio representam 3,52%, sobre a renda 24,14%, e sobre o consumo 68,20%. Nos países da OCDE, esses indicadores representam, respectivamente, 5,4%, 36,9% e 30,4% Estudo feito pela jornalista Samantha Maia aponta que pessoas que recebem um salário mínimo (R$ 724,00) pagam 37% de seu salário somente em impostos ao ano, um total de 153 dias só para os tributos; já observando uma pessoa com um salário igual ou superior a R$ 22.000,00 paga, ao ano, 17% de seus rendimentos em tributos, o que é igual 106 dias para os impostos.

Sobre a "Reforma Tributária", durante um bom tempo vem sendo discutida, mas pouco vem sendo feito para sua efetiva concretização. Visto o cenário acima, uma solução que pode vir de imediato seria a redução da carga tributária, mas isto prejudicaria os mais pobres, já que boa parte do que se é arrecadado em impostos é transformado em investimentos públicos para serviços e ofertas fundamentais, nos quais os mais pobres são os principais usuários, como educação e saúde públicas. Logo, o necessário que se respeito o que é previsto pela Constituição Federal no art. 145 inc. 1º, no qual " os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte." Isto significa que a carga tributária deve incidir de acordo com a capacidade que a pessoa tem de pagá-la. Pensando desta forma, a tributação deve incidir sobretudo na propriedade, pois é esta que apresenta melhor indicador da capacidade de contribuição do indivíduo, para, assim, "roubar" dos ricos para dar aos pobres.

Sendo assim, um imposto que seria capaz de realizar a melhor distribuição de incidência da carga tributária é o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), tratando-se de um imposto instituído desde a Constituição Federal de 1988 Pelo art. 153, cabendo a uma "lei complementar" realizar sua implementação. É tarefa, portanto, do legislador da lei complementar definir o que é uma grande fortuna passível da referida tributação, e é essa definição que engendra nas críticas à existência de tal imposto.

Os que questionam a efetividade do imposto alegam que muitas pessoas podem ser consideradas detentoras de fortunas graças ao aquecimento imobiliário dos últimos tempos, assim como as que acumulam bens e valores no valor de milhões de reais. Segundo esse argumento, pessoas que não são realmente ricas podem sofrer a tributação. E um segundo problema se refere à base de cálculo das tributações, com várias exclusões acerca de valores de imóvel residencial, bens utilizados na atividade profissional, bens de pequeno valor e etc, dificultando os processos de apuração, arrecadação e fiscalização das grandes fortunas. Além do mais, muitos argumentam que tal imposto tributa mais de uma vez o que já é tributado por outros impostos, tais como o IPTU e o IPVA, defendendo que se tribute a fortuna dinâmica, isto é, a geração de riqueza circulante.

O fato é que a discussão/implementação do IGF ou imposto afim é uma tendência mundial. Estados Unidos, Alemanha e França estudam a implementação do imposto, sendo que o último adotou um imposto semelhante por um período de dois anos. Países sul-americanos como Argentina, Colômbia e Uruguai são exemplos de países que tributam progressivamente a riqueza. No Brasil, há certa resistência com sua implementação visto alguns argumentos explicitados acima. O caso seria uma adaptação do IGF de acordo com as especificidades do sistema tributário brasileiro contemporâneo. Portanto, cabe a discussão acerca da implementação de um imposto incidente em grandes fortunas, e não a resistência em implementá-lo, sendo esta uma postura elitista e corporativista, pois visa o resguardo da fortuna dinâmica em vez do bem social comum.

Em pesquisa, o IPEA expressa que 2,5% das famílias ricas são brasileiras, e a estimativa de arrecadação com a implementação de um IGF seria de 10 bilhões a ser tributado de apenas 10 mil famílias. Das 10 mil famílias, estima-se que metade teria um patrimônio equivalente a 40% de todo o PIB nacional, o que demonstra que o IGF teria uma potencial compensador com sua implementação no pais.

Deste modo, o IGF geraria maior equidade e justiça na tributação, distribuindo a carga tributária dos contribuintes de acordo com sua capacidade de pagá-la. A tributação de riquezas, portanto, representa o caráter distributivo da política econômica, uma vez que taxa os que possuem mais, levando-se em conta que isto é um princípio de justiça tributária. Isto iria na contra mão da hiper taxação que classes menos privilegias financeiramente sofrem pela tributação indireta de impostos como IPI, ICMS e ISSQN.

A política "Robin Hood" teria mais chances de não ocorrer dos avessos, como no cenário atual do país, com uma distribuição de finanças que contemple os serviços e ofertas públicas que são de interesse da população toda. Pensando em alguns temas atuais, o política do Passe Livre, isto é, o total subsídio governamental da tarifa do transporte público, poderia ser financiado pelo IGF ou imposto afim, assim como mais investimentos no SUS em regiões periféricas, ampliação geográfica do saneamento básico, mais investimento em educação pública, maior incentivo à cultura e a projetos culturais, entre outros. Reforma tributária com responsabilidade SOCIAL é, sim, possível" ?

Referências Bibliográficas
http://www.cartamaior.com.br/?/Opiniao/Imposto-sobre-Grandes-Fortunas-de-volta-a-cena-com-a-forca-das-ruas/30067
http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/artigos/66583/imposto+sobre+grandes+fortunas+a+dificil+tarefa+do+congresso.shtml
http://getulio.jusbrasil.com.br/artigos/114110300/o-robin-hood-brasileiro
Constituição Federal: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm acesso em: 12/05/2014
GASSEN, Valcir. D'ARAÚJO, Pedro. PAULINO, Sandra. Tributação sobre consumo: o esforço em onerar mais quem ganha menos. Grupo de Pesquisa Estado, Constituição e Direito Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB). Brasília, 2013.

__________________
(1) o IOF, o PIS e o COFINS também são impostos cujo ônus recai sobre o consumidor final; portanto, eles também podem ser incluídos como tributos que incidem sobre o consumo. Valorizando a objetividade, aqui trataremos apenas do IPI, ICMS e ISSQN

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentário foi publicado. Obrigado por visitar o pensalítica.